Por Rose Dutra
Para ser um contraponto às notícias sobre crimes, violência e mortes do jornalismo sensacionalista, praticado na época no país, em 1907, surge a coluna social na imprensa brasileira, conforme registra Brito Broca, em “A vida literária no Brasil 1900”. Era denominada “Binóculo”, escrita pelo jornalista Figueiredo Pimentel.
Com o tempo, a coluna social começou a ganhar novos contornos e a devida importância, deixando de ser considerada leitura sem prioridade. Surgiram nomes como Ibrahim Sued, referência para muitos, e Zózimo, essencial nas mudanças ocorridas no colunismo social.
Em Uberaba, o Netinho (Ataliba Guaritá Neto) é a maior referência na arte de destacar pessoas da sociedade uberabense. Nele, algo mais era inspirador: o amor por Uberaba.
Em meio às festas, o burburinho sempre era sobre as apostas de quem sairia na Coluna do Netinho. E foi dele a indicação para que o escritor, poeta e animador cultural, Jorge Alberto Nabut, assumisse uma coluna social, sendo logo o escolhido pelo Jornal da Manhã, onde permaneceu por 42 anos.
Escrevendo sobre economia e negócios, a economista e professora universitária Olésia Borges foi desafiada para mudar o foco, aceitou e assina coluna social no Jornal de Uberaba há 20 anos.
A revista quis saber como os colunistas escolhem os destaques, como veem as mudanças trazidas pela internet, e os desafios para continuar atraindo a atenção dos leitores. Representando os demais colunistas sociais da cidade, a Personalità convidou Olésia e Jorge. Hoje, eles são os homenageados!
Revista Personalità - A arte de pinçar destaques da sociedade é para poucos. A que você atribui o seu sucesso na cena social de Uberaba?
Jorge Alberto Nabut - Não sei se houve/há sucesso meu na cena social de Uberaba. Indicação de meu nome para trabalhar no colunismo social coube ao colunista Ataliba Guaritá Neto (Netinho, do Lavoura e Comércio), homem de grande astral, que a tudo via com otimismo. Ele já havia publicado notas a meu respeito, como escritor, poeta e animador cultural. Parece que deu certo rsss. Tanto é que, logo fui fisgado pelo JM.
Olésia Maria Borges - Selecionar um tema ou assunto para divulgar numa coluna social constitui o diferencial do profissional nesta área. O sucesso junto aos leitores decorre exatamente da forma como a notícia é tratada e reportada, da leveza, elegância e, acima e tudo, da verdade dos fatos. Estes fatores conferem respeito e credibilidade ao colunista e ao seu trabalho.
RP - O que levou você a escolher investir seu tempo ao longo de décadas nesta área?
Jorge - Trabalhar naquilo que se gosta é o maior acerto que se pode ter na vida. Obviamente, as oportunidades de trabalho nem sempre surgem desta forma. Como diziam na minha infância, a gente não come somente daquilo que se gosta. A receita vale não somente para a gastronomia, mas para o enfrentamento da vida. Há necessidade de se adaptar àquilo que está a seu alcance, quando não se tem a ousadia necessária para os grandes saltos que a juventude propicia ao sujeito inquieto de seu lugar. Temos de ser felizes onde estamos, ou cair fora, rapidinho, em busca de outros ares, outros mares. Trabalhar no colunismo social me proporcionou viver em área de total conforto, privilégio de poucos. Fazer o que gosto, sem deixar o quibe e as esfihas de Mariana. Rsss Trabalhar foi o que mais fiz na minha vida, segundo me ensinaram meus pais, Elias Nabut e Mariana Abdanur. Veja só: somando todo meu tempo de trabalho - em linha reta - até 31 de dezembro de 2020, foram dois anos de Lavoura e Comércio, 44 anos no Jornal da Manhã, um ano de ACIU, 23 anos na Fundação Cultural de Uberaba, 26 anos no antiquário Belgrávia, mais um ano na Uniube, um ano na F. Franco Engenharia, um na GR-1000 e 10 meses no Arquivo Público, um total que corresponde a 105 anos e 10 meses. Você nunca viu esta conta, que é original, engraçada, mas faz sentido. E ainda tenho um restinho pela frente, conforme os últimos exames médicos e a opinião de professores da Academia Fit Uirapuru. Nesse restinho dá para fazer muita coisa, como lançar dois livros, este ano, dois em 2022, correr atrás de trabalho e de viagens, se os dólares e os euros, cada vez mais escassos permitirem kkkkk.
Olésia - O colunismo social aconteceu de forma natural em minha vida. Nunca procurei, ou tive intenção de assinar uma coluna no jornal. Sou economista por formação e sempre fui professora. Além da área acadêmica, trabalhei durante vários anos, na gestão de negócios, e na área gerencial de uma extinta instituição financeira, a MinasCaixa. Quando fui convidada para assinar uma coluna no Jornal de Uberaba, a área em questão era “Economia e Negócios”. Com as mudanças, inclusive na equipe do jornal de Uberaba, fui desafiada a mudar o foco do meu trabalho, partindo então para o colunismo social. Aliás, naquele momento, as colunas sociais também passavam por mudanças, revelando-se a necessidade de uma nova abordagem. Com o surgimento de uma “nova elite social” a mulher passa a ser vista não como socialite ou colunável, sendo então valorizada, pelo seu novo papel na sociedade, e seu protagonismo na busca do seu empoderamento social.
RP - Há quem acredite que colunismo social seja simples, mas observadores conseguem ver mais além. Porque colunismo é muito mais do que fotos e legendas, concorda?
Jorge - A sobrevivência no colunismo social depende, antes do talento, de jogo de cintura e da prática da paciência, que é a ciência da paz. Pessoas de temperamento difícil não ficam tanto tempo numa empresa. Por outro lado, é preciso reavivar aquilo que a sociedade oferece de melhor. Numa cidade reconhecidamente fechada, como Uberaba, e de proporção mediana, pouco mais de 300 mil habitantes, onde se vive na proximidade com todos, o cuidado é fundamental para não ferir suscetibilidades. O mesmo procedimento é necessário dentro da empresa em que se atua. Não é fácil, não é moleza, não é brincadeira, mas é assim que funciona. Daí eu ter atuado por mais de 40 anos no Jornal da Manhã, sem nunca ter tido problemas com ninguém; nem com colegas de trabalho, nem com leitores de quem, aliás, poupamos todo tipo de alfinetadas, tão comuns no colunismo dos grandes centros. É difícil e é complicado. Muito complicado. Às vezes, você mesmo – ou ela própria? – não sabe o que a sociedade quer de você, mesmo que você a tenha valorizado até o limite. Daí a importância de modernizar o conceito de colunismo, seguir inovadores como Zózimo, meu sonho de consumo como profissional da área, nos meus primeiros tempos de jornalista social. Porém, o jornalismo exercido por Zózimo só é permitido em cidades grandes.
(Zózimo Barroso do Amaral atuava no Jornal do Brasil e O Globo, ambos no Rio de Janeiro)
Olésia - Como define o próprio nome: “coluna” pressupõe textos e comentários jornalísticos, atuais e interessantes. No caso do colunismo social os textos e fotos se completam e, a linguagem deve ser leve e atraente, além de elegante e com uma certa dose ”glamour”. No meu entendimento, inclusive como leitora, não considero “coluna social” uma reportagem fotográfica, mesmo que ela venha com uma abordagem e enfoque social.
Colunistas sociais trabalham buscando notas sobre artistas, celebridades, milionários, figuras excêntricas, autoridades e outras pessoas. Como é feita a escolha?
Jorge Nabut - A escolha dos colunáveis é um caso sério, mas também agradável. Evidentemente, começa pelo gosto do colunista, pela identidade quem tem com quem se destaca, algo que vai além da grife do vestido ou da marca da bolsa. Há pessoas que transitam acima dos conceitos de moda. Maria Alice Terra Schimidt, para citar um nome, já ausente, foi uma delas. Persona elegante. Focamos muito na mulher, por ser o elemento mais consumidor, mais aberto às novidades, e esquecemos os grandes empresários, os grandes criadores que, somente agora vêm ganhando projeção, com homens nas capas das revistas, justamente através de mudanças de comportamento dos jornais.
Olésia – Percebo que os termos “colunável” e “socialite” passaram por grandes mudanças nos dias atuais. Embora figuras de destaque e projeção social, como artistas, celebridades, milionários, figuras excêntricas, empresários, políticos e autoridades sempre frequentem as colunas sociais, o foco e a abordagem são diferentes. O colunismo do passado abriu espaço para novos enfoques e nova elite inclusive pelo fato de o dinheiro ter mudado de mãos. O agronegócio mudou o protagonismo dos grandes barões da indústria para os poderosos empresários do campo, inclusive com a presença e parceria da mulher. Hoje, o termo “socialite” é considerado pejorativo por muitas mulheres. Com o protagonismo feminino e o empoderamento da mulher, esse adjetivo, antes, muito usado pelos colunistas sociais, vem caindo em desuso.
Com as redes sociais engolindo veículos impressos de comunicação em tempo real, você migraria para a ferramenta?
Jorge - Impulsionadas pela internet, como tudo, aliás, que evoluiu, as redes sociais viraram o mundo de pernas para o ar, influenciaram tudo, mudaram tudo e vão continuar mudando, pois, tudo tem sido inventado por ela e para ela. O Uber e o Pix são consequência delas. A internet é ferramenta poderosíssima que a humanidade vai continuar a desfrutar dela, reduzindo, avassaladoramente, os distanciamentos geográficos, sociais e comportamentais. Infelizmente, não as exploro como poderia, deveria e gostaria. O colunista social permanece lógico, nas redes sociais, através da internet e dos blogs. Tornou-se impossível o colunismo revelar fatos. Até que as novidades sejam publicadas, as redes sociais já o fizeram, inclusive sob o ponto de visto crítico, no bom ou no mal sentido. Há tempos já é assim e ao colunista, hoje, cabe a análise, o julgamento, a ponderação dos fatos vindos à tona.
Olésia - Não vejo as redes sociais como concorrentes do colunismo social. Até porque atualizações das colunas sociais também podem ser feitas em tempo real. Por outro lado, tradicionais veículos de comunicação impressos se renderam ao novo formato dos blogs e colunas dos sites na internet. Jornais e mídias tradicionais estão presentes nesses sites e outras ferramentas disponíveis na internet. O que mudou, realmente, foi a forma como o leitor de um jornal tradicional busca a notícia. No caso específico da coluna social, mesmo que as “selfies” e “postagens” de uma festa ou evento aconteçam em tempo real, os leitores de um respeitado colunista, ou seguidores de um ” influencer” querem conhecer, ver a opinião e os comentários desses profissionais.
RP - Você concorda que os desafios para o colunismo são inúmeros, como atrair a atenção do leitor por meio de notícias inusitadas, com um olhar diferente sobre os assuntos e uma linguagem original?
Jorge - Sempre se disse que as fontes são estritamente confidenciais e todos os cuidados devem ser tomados para preservá-las, diversificando-as, para que não se perceba quem é o informante. Ibrahim Sued fez isso, com perfeição. Muito depois é que se soube que o escritor, Guimarães Rosa (autor de obras-primas como Grande Sertão: Veredas, provavelmente o maior romance escrito no Brasil no século XX) era informante de Ibrahim, nos seus tempos de Itamarati. Se não falei demais, me resta dizer que somente aceitei fazer coluna social com a condição de nela inserir temas culturais, que sempre foram meu foco de interesse. Além da difusão cultural, feita no meu espaço específico, dezenas de páginas, de mesmo teor, foram assinadas por mim, no Jornal da Manhã, e que são, hoje, fontes de matéria para publicação de livros. Sem a cultura, não teria feito sentido eu trabalhar no colunismo social, mesmo que ele tenha sido o meu “ganha-pão” naqueles anos todos. Aliar cultura e colunismo me permitiu ter iniciativa da criação do Centro Paleontológico de Peirópolis, com Beethoven Teixeira; do Museu de Arte Sacra, com força de Ângelo Oswaldo dos Santos, e do Arquivo Público de Uberaba, com chancela do Arquivo Público Mineiro, tudo com apoio total e irrestrito do professor José Thomaz da Silva Sobrinho, sempre à frente da Fundação cultural de Uberaba, e as bênçãos de Wagner do Nascimento. Nos tempos de Marcos Montes criamos o MADA-Museu de Arte Decorativa, com apoio das historiadoras Sônia Fontoura e Maria Antonieta Lopes, entre outros tantos mais. E la nave va!
Olésia – Os desafios para conquistar e fidelizar leitores continuam sendo o diferencial de uma coluna que deve ser atrativa, com textos originais e diversificados, além de criativos, e com uma linguagem leve, acessível e, acima de tudo, interessante. Os jornalistas dependem de fontes confiáveis e fidedignas, os colunistas necessitam de relacionamentos interpessoais, contatos e informações atualizadas sobre o universo de interesse dos seus leitores
Revista Personalità - Que resumo você faz sobre as mudanças nos últimos tempos?
Jorge Nabut - Integrei uma das gerações mais importantes de todos os tempos. Deixamos os boizinhos de chuchu da infância, quando todo tipo de informação era bloqueada às crianças, para ingressar na era das viagens e conquistas cósmicas, passando pelo rádio, televisão e o desbunde da internet. Formamos também a geração mais dançou na história da humanidade. Uma cidade como Uberaba, tinha três quatro pistas para dançar, numa só noite. E o peão era sempre feito na Paddock, do Jockey Club de Uberaba. Fora as idas às boates do Rio de Janeiro e São Paulo e o tanto que suávamos nossos ternos nos bailes e nas festas de casamento. Foi demais! A música eletrônica, maravilhosa, encerrou a fase fantástica. A dança foi trocada por movimentos de braços, para lá e para cá. Acho pouco para quem tem o corpo inteiro para agitar. Hoje, com quatro universidades, não temos uma única boate em Uberaba. Hei DJ, cadê tu?!
Olésia - Ibrahim Sued sempre foi e será referencia no colunismo social. Em nossa cidade, Ataliba Guaritá Neto, o querido e saudoso Netinho, da coluna “Observatório”, do também saudoso “Lavoura e Comercio”, é outro ícone do colunismo social. Netinho fez escola e fincou raízes fortes para a sobrevivência e valorização dos colunistas sociais de nossa cidade e região. Apesar das mudanças e inovações impostas pela tecnologia, novos paradigmas e comportamentos sociais, os valores e exemplos de companheirismo e valorização da figura humana sempre serão inspiradores para a convivência e sobrevivência do colunismo social. Agradeço a você e à revista Personalità por abrirem espaço para uma abordagem sobre os desafios e o futuro do colunismo social, que, aliás, sempre colocou Uberaba, como pioneira e vanguardista, também nessa área.
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